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terça-feira, 19 de outubro de 2010

Carecer de Carência


O autor: Deiwytt Naomar Rustick, aluno de psicologia da SETREM.


Carecer de Carência
Por Deiwytt Naomar Rustick*


Carecer é próprio do ser-humano. Remete-se a necessidade de algo que lhe causa falta. Necessidade remete-se a desejo. Ao continuarmos dissecando a palavra carência iremos perceber que estamos falando de algo que faz parte da natureza humana. Carência de comida, carência de dinheiro, poder, carência de tudo! Sempre estamos a procura de algo, na procura de seus sonhos mais secretos, na procura de um tesão para viver. Somos carentes, carentes de tudo, carentes de vida. Sim, você é carente, eu sou carente e carente seremos dentro de nossa normalidade humana. Dopamos realidade buscando o que nos falta, procuramos alternativas em todos lugares e, assim, dopamos o nosso tesão pela vida.

“Tudo azul
No céu desbotado
E a alma lavada
Sem ter onde secar

Eu corro
Eu berro
Nem dopante me dopa
A vida me endoida


Eu mereço um lugar ao sol
Mereço ganhar pra ser
Carente profissional”


Barão Vermelho – Carente Profissional

Nossa perspectiva de desejo, quando pensada dentro de um contexto “de carecer” torna-se deturpada. Se você está carente de fome, come tudo que vem pela frente. Se você está carente de amor, não suporta os galanteios de Don Juan’s ou Capitu’s que estão aguardando a sensibilidade de outros a procura do que carecem. Desejo por desejo, necessidade por necessidade, prazer por prazer. Lógica distorcida do querer e do não querer querendo.

“Levando em frente
Um coração dependente
Viciado em amar errado
Crente que o que ele sente é sagrado
E é tudo piada.
Tudo piada!
Eu mereço um lugar ao sol
Mereço ganhar pra ser
Carente profissional”


Barão Vermelho – Carente Profissional

Quem não merece um lugar ao sol? Quem não merece ser feliz? A carência de tantas pessoas gera uma comunidade carente.

“Eu moro numa comunidade carente
Lá ninguem liga prá gente
Nós vivemos muito mal
Mas esse ano nós estamos reunidos
Se algum candidato atrevido
For fazer promessas vai levar um pau
Vai levar um pau prá deixar de caô
E ser mais solidário
Nós somos carentes, não somos otários
Prá ouvir blá, blá, blá em cada eleição”


Zeca Pagodinho – Comunidade Carente

Para um candidato político carente de votos, uma comunidade carente de uma vida justa é alvo certo. Afinal, é uma massa sem cérebro, que se resume a um aglomerado útil de dois em dois anos, momento que a carência do ser político precisa de alimentação. Alimentação, feijão e arroz! Boa fonte de nutrição! Nem só de arroz e feijão uma pessoa sobrevive, uma galinha a mesa também é bem-vinda de vez em quando.

”A mim não importa
Os culpados por viver assim
Só preciso de alguém
Para cuidar de mim
Que me ensine a na vida
Ser um vencedor”


Jorge Gomes – Criança Carente

“O maior solitário é o que tem medo de amar, o que tem medo de ferir e ferir-se, o ser casto da mulher, do amigo, do povo, do mundo. Esse queima como uma lâmpada triste, cujo reflexo entristece também tudo em torno. Ele é a angústia do mundo que o reflete. Ele é o que se recusa às verdadeiras fontes de emoção, as que são o patrimônio de todos, e, encerrado em seu duro privilégio, semeia pedras do alto de sua fria e desolada torre”.

Vinicíus de Moraes

Quando os sonhos parecem demasiado grandes e de difícil acesso, o tesão pela vida e por tudo que nos rodeia fala mais alto. Esse tesão faz questionamentos surgirem em nossa mente. Certos fatores que antes eram tão bem resolvidos e afetados por estigmas intrínsecos em nossa cultura se tornam duais. Dualidade que confunde, dualidade que afeta a moralidade, afeta a normalidade. O que é certo? O que é errado? Se a vida joga pesado contigo, será que não precisamos jogar pesado com a realidade? Não sei. Não sei o que é certo e errado. Você sabe? Minha verdade é diferente da sua e isso nos torna únicos. Tão lindo não? Tão lindo que um ponto de vista depende da subjetividade da pessoa. A mesma imagem com diferentes interpretações e as interpretações com diferentes imagens. Tão iguais aos olhos de quem observa apenas o palpável e deixa de lado o que foi dito porém não falado, o que está atrás das interpretações, atrás da imagem. Tudo aquilo que nos torna desiguais e seres de opinião própria. Tudo aquilo que nos torna carentes de carência, carentes de carecer, carentes de viver.

*Texto elaborado na disciplina de Psicologia Comunitária e Projetos Sociais ministrada pelo prof. Luciano Bedin

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